Por Silene Quintão
Nosso campo foi realizado por uma equipe de pesquisadores que estudam a fronteira do Brasil com a Bolívia. A equipe se subdividiu para a coleta de informações, aplicação dos mapas, visitas e entrevistas na região.
Nossa pesquisa foi realizada em três escolas publicas da Cidade de Costa Marques– Rondônia- Brasil, ela faz fronteira com a cidade em palafitas Buenas Vistas, na região do Beni /Bolívia. Utilizamos o referencial teórico-metodológico da aplicação de mapas mentais desenvolvido pela pesquisadora Dra. Salete Kozel . Nosso objetivo foi identificar quais as Representações que os alunos moradores da região tinham da fronteira. Realizamos visitas em duas escolas na área urbana de Costa Marques e uma escola na comunidade do Forte Príncipe da Beira, para reconhecimento e entrevistas com as equipes gestoras; desenvolvendo a metodologia dos Mapas Mentais com alunos de diferentes idades. Buscamos conhecer a percepção que eles tinham da fronteira, através das narrativas dos moradores; conhecer os aspectos das interações fronteiriças; conhecer um pouco da história da constituição dos territórios nacionais fronteiriços (Brasil e Bolívia) e as ligações que se estabeleceram neste espaço fronteiriço.
Ambiente visto de frente, posicionado na horizontal com predominância de formas no espaço da Fronteira de Costa Marques (BR) e Buena Vista (BO). Os signos estão representados por linhas, objetos, figuras geométricas que representam à paisagem local (cidade) localizada a margem direita do rio Guaporé. Destaca a paisagem natural (peixes, água, árvores e sol), representa os elementos humanos em seu cotidiano utilizando o espaço como fonte de vida e sustento.
Diante do cenário observado a casa construída sobre estacas representa o espaço vivido à relação afetiva entre a pessoa e o lugar, transmite segurança, estabilidade, proteção e pertencimento. A figura dos barquinhos representa o cotidiano, meio de sobrevivência e sustento. O espaço do lazer também se encontra representado por meio da interação (jogo). Segundo Kozel (2007),os mapas mentais aqui analisados são de alunos da cidade de Costa Marques-RO, e por meio dos mapas procuramos compreender alguns aspectos das relações sociais entre brasileiros e bolivianos. É importante entender como se dá o processo de interação social entre alunos viventes na fronteira Brasil-Bolívia, uma vez que afronteira não representa a divisão entre os povos, verifica-se que eles partilham da mesma cultura e interagem entre si. A boa relação existente entre os jovens bolivianos que atravessam o rio e frequentam as escolas brasileiras é um dos pontos positivos, outro ponto forte e o comércio local boliviano muito frequentado por brasileiros não só residentes em Costa Marques, mas turistas de outros estados e municípios. É comum encontrar produtos provenientes do comércio boliviano no lado brasileiro. Outro fator positivo é o bilinguismo presente em alguns alunos brasileiros e bolivianos. Neste contexto o mapa mental aqui representado nos revela cotidiano harmônico entre o homem e o espaço onde
O mapa nos revela os signos icônicos diversos, letras, linhas horizontais, figuras geométricas dispostas nas laterais, não há representação de elementos da natureza e humanos.
Percebe-se que algumas das representações sociais relacionam os bolivianos às práticas ilegais conforme representada na figura a cima, uma fronteira vulnerável ao tráfico de armas, drogas, contra bando de mercadorias, furto, roubos e assaltos. A vulnerabilidade da fronteira acaba beneficiando os consumidores de baixa renda que fortalecem o comercio adquirindo os mais variados produtos, desde roupas, produtos eletrônicos, fraldas entre outros com preços mais acessíveis.
Neste contexto os mapas mentais permitem entender o ambiente social do indivíduo seguindo a metodologia de Kosel. O desenho aqui analisado reflete o viver de um grupo social, sua cultura e referência espacial do ponto de vista do aluno.
Para Kosel (2007) o espaço não é somente percebido, sentido ou representado, mas, também vivido. As imagens que as pessoas constroem estão impregnadas de recordações, significados e experiências. Tais afirmações reforçam a importância das experiências vividas e a localização do individuo no espaço. Não apenas os aspectos negativos, mas como uma forma de interação social específica.
Composição do ambiente visto de frente com linhas retas e curvas. Organização na horizontal com predominância de formas representando o espaço dos dois lados da fronteira. Presença de elementos da paisagem natural (sol, nuvens, rio, peixes, árvores). Presença de elementos da paisagem construídos pelo homem (barcos, casas, ruas).
Noção de distancia, de um lado ao outro da fronteira. Desenho bem colorido fez uso das cores seguindo as cores reais do ambiente na fronteira e do rio com águas escuras e barrentas. Os barcos como um espaço de interação e diversão entre os sujeitos fronteiriços com representação do cotidiano na fronteira.
[…] o lugar é uma unidade entre outras unidades ligadas pela rede de
circulação; o lugar, no entanto tem mais substancia do que nos sugere a
palavra localização; ele é uma entidade única, um conjunto “especial”
que tem história e significados. O lugar encarna as experiências
e as aspirações das pessoas. O lugar não é só um fato a
ser explicado na ampla estrutura do espaço, ele é a realidade
concreta a ser esclarecida e compreendida sob a
perspectiva das pessoas que lhes dão significados.
(TUAN, apud HOLZER, 1999, p. 70).
O aluno trouxe em sua representação o espaço da fronteira e o sentimento de conhecimento e pertencimento do lugar onde mora, o ir e vim dos sujeitos fronteiriços naturalmente de um lado para o outro e de como ele vivencia a vida na fronteira indo para a Bolívia e voltando com as compras, pois o outro lado da fronteira é exclusivo para compras e pesca. As lojas funcionam nas próprias casas dos moradores e são construídas sobre palafitas. Um espaço que tem o comércio e a pesca como principal foco pois na parte que fica atrás dos palafitas em épocas de chuvas o rio enche e ficam alagadas.A importância do lugar torna-se referência e identidade, de compras de objetos de subsistência, de lazer, de pesca, é importante na compreensão do próprio lugar.Os símbolos ajudam a manter identidade cultural: o porto onde ficam as embarcações, mostram o espaço físico-construído e o espaço sentimental que fica agregado aquele lugar.
Os mapas mentais aqui representados possiblitaram uma análise a respeito da fronteira de Costa Marques (BR) Buenas Vista (BOL) visto através dos olhares dos alunos que moram no lado brasileiro e de sua vivência na fronteira. Apontam um caminho para diversas interpretações e ao mesmo tempo, proporcionam uma observação sensível do lugar que está impregnado de elementos subjetivos presentes no seu cotidiano.
O Lugar encerra uma multiplicidade de relações, expondo funções de uso determinadas pelos ritmos de vida e pelas formas de apropriação do espaço a partir do corpo e de sua função social. É possível perceber a relação entre o espaço e o comportamento humano no ambiente, refletindo aspectos orgânicos, cognitivos, afetivos e simbólicos como indicadores importantes do lugar. Para Buttimer o lugar refere-se a esse espaço cotidiano em existe uma relação harmônica entre o corpo e o espaço.
O mapa mental está disposto na forma horizontal representando a fronteira das cidades de Costa Marques (RO) e Buenas Vistas (BO). Os signos estão representados por linhas e figuras geométricas. Possui elementos da paisagem natural: o rio, a água, os peixes, as árvores, sol, nuvens e elementos da paisagem construída: casas e barcos. Há presença de elementos humanos em seu cotidiano.
De acordo com a observação do mapa a aluna descreve sua visão em relação ao rio que une as duas cidades, suas experiências, as dificuldades, o tráfego e o rio como fonte de sobrevivência deixando claro sua relação harmônica com a água. A figura das casas retrata a relação afetiva com o lugar protagonizando a segurança individual sentindo-se parte do lugar em que vive.
A cultura local encontra-se influenciada pela travessia de um rio e a problemática que o cerca. Bachelarde (2008) enfatiza a poética do espaço as imagens emergidas na consciência como produto direto do coração, da alma do ser humano, o que leva o homem a uma atitude contemplativa diante do espaço e do lugar no qual vive e estabelece relações sociais. Neste sentido o mapa descrito mostra o espaço vivido pelo sujeito, suas emoções e situações vivenciadas no cotidiano diário.
Percebemos através dos mapas mentais que a concepção de fronteira que os alunos apresentam, trazem consigo muito mais que a demarcação entre os dois países, trazem sua história, memória, cultura, sentimentos de pertencimento e estranhamento, vivencias e identidades. Nas categorias apresentadas nos mapas mentais podemos perceber que alunos Bolivianos freqüentam a escola no lado brasileiro e mantém uma boa interação e relação de segurança. Isso também ficou evidente nos alunos brasileiros que vem a fronteira naturalmente e tem impregnados em suas identidades valores, costumes, crenças baseados na cultura local formada pelos dois países. Foi possível observar que alguns alunos resumem a fronteira como o espaço territorial em que vivem enquanto outros tem uma visual mais ampla sentindo a fronteira desde as características físicas do lugar e de sua relação com o meio ambiente, dos sujeitos que compõe esse espaço, de cenas do cotidiano na fronteira até como ele se percebe dentro de todo esse processo.
Também foi possível observar a valorização pelo espaço da fronteira como meio de subsistência através da pesca, do comércio que traz além de produtos importados com preços acessíveis aos seus moradores se apresenta como uma alternativa econômica e do empreendedorismo individual e coletivo. Os mapas mentais nos oportunizaram a compreender a relação das pessoas com o espaço vivido na fronteira e apresentam imagens dos lugares de convivência social cheios de significados e o dialogismo do espaço com o lugar. E mesmo que a grande maioria perceba a fronteira como um local seguro e acessível foi representado também em alguns mapas mentais o medo, o contrabando de produtos, trafico de drogas e armas, o cambio negro e outros fatos negativos que estão intimamente ligados ao fluxo transfronteiriço. Outro fator que ficou fortemente evidenciado em alguns mapas mentais foi que mesmo tendo nascido em Costa Marques alguns alunos não conheciam o outro lado da fronteira tendo apenas a visão do espaço físico que liga os dois países.
Moro aqui e nunca parei para pensar como cada criança entende a Fronteira.É maravilhoso poder perceber através da análise dos mapas mentais como as crianças moradores de Costa Marques e Buenas Vistas percebem a nossa fronteira, cada olhar traz suas próprias experiências! Parabéns aos pesquisadores que nos deram a oportunidade de apreciar o resultado dessa pesquisa.
Muito boa a explanação do conteúdo!! Interessante!
Parabéns professora, gostei bastante da sua pesquisa, a divisa da fronteira e sua influência sociocultural no nosso Estado. Parabéns 👏🏻👏🏻
Excelente trabalho de grande relevância à população rondoniense.
Parabéns aos pesquisadores que laborar neste artigo.
Parabéns, Mestranda e colega
Silene Quinto.
Parabéns Silene pela excelente pesquisa. Muito interessante as representações que as crianças fizeram a respeito de suas compreensão a cerca da fronteira , e mais ainda, o registo de uma rica cultura marcada em seus desenhos , onde puderam deixar uma diversidade de visões cultural e histórica da localidade em que estão inseridos.
Trabalho de grande relevância ao no Estado por trabalhar essa especificidade das fronteiras, parabéns a Silene e aos demais pesquisadores.
Enriquecedor esse trabalho a fronteira social como lugar de passagem pode, também, se constituir para que as identidades, situadas de parte a outra de seus limites, se oponham ou se misturem. Modelam-se, pois, entre-territórios, culturalmente , graças às construções de novas identidades.
Como é importante vê estudos como esses sobre a nossa região, um espaço rico de cultura, mostrando as realidades sociais aqui vivida. Parabéns professores pesquisadores!